sexta-feira, 12 de março de 2010

Par Mínimo

LETRA MÁGICA
José Paulo Paes
Que pode fazer você
para o elefante
tão deselegante
ficar elegante?
Ora, troque o F por G.

Mas se trocar, no rato,
o R por G
transforma-o você
(veja que perigo!)
no seu pior inimigo:
O gato.

Par mínimo é um par de palavras cuja diferença é um único fonema. Um fonema que corresponde, no caso dessas comutações do poema, a uma letra (mas nem sempre). Uma letra que muda tudo! Quantas possibilidades de brincar! Aliás, bem ao gosto de José Paulo Paes, um brincante das letras, que, em seu Convite, nos convida a brincar, sem parar, com as palavras...
E por falar em par mínimo, tem uma brincadeira legal que é ir transformando as palavras em outras, sendo a regra principal trocar uma só letra, qualquer uma, de cada vez, a cada transformação. Ex. LUA - RUA - RIA.
Esse jogo - que é um jogo pra se jogar sozinho ou em dupla, cada um na sua vez fazendo as trocas - usa o princípio dos pares mínimos, embora, por ser um jogo escrito, contenha apenas comutações de fonemas que correspondam a comutações gráficas de uma só letra. Não vale por exemplo, trocas como XALE - CHAVE, que é um par mínimo genuíno, pois apenas o fonema /l/ foi trocado por /v/. Notem que CH e X (/xali/ - /xavi/) têm o mesmo som /x/, é o mesmo fonema. Não valem no jogo, pois uma das regras é manter o número de letras do começo ao fim, sendo, nesse caso, na verdade, um jogo gráfico, de comutação de letras.
As palavras transformadas, evidentemente, devem fazer sentido, serem palavras de fato, e devem ter o mesmo número de letras da palavra inicial. O desafio geralmente é transformar uma palavra na outra, ambas dadas de início - com o mesmo número de letras - e devemos buscar o menor número de linhas possível nessa transformação, mas há também outros desafios. Um desafio maior é procurar chegar em palavras que guardem alguma relação com a palavra inicial, como semelhança sonora, sinônimo ou antônimo, mesmo campo semântico etc. Mas essas regras não precisam ser seguidas, elas apenas aumentam o desafio. O importante é a regra de trocar apenas uma letra por vez.
Podemos sair de uma palavra e voltar depois de muitas para a mesma palavra do início. Ex:
LUA
SUA
NUA
RUA
RIA
RIO
FIO
TIO
TIA
PIA
LIA
LUA

Podemos sair de uma palavra para chegar em outra, como é no jogo original.
Ex. Transforme PATO em SAPO:
PATO
RATO
MATO

MATA

MAPA

SAPA

SAPO
Ah! Lógico que não há um único caminho possível de chegar a uma mesma palavra. Por exemplo, para PATO virar SAPO, podemos também fazer: PATO - MATO - MOTO - FOTO - FOCO - SOCO - SACO - SAPO

ou ainda outras formas...
Tente agora você transformar PÃO em MEL, LUA em SOL.
Podemos ainda apenas ir transformando, sem fim, as palavras.
Em sua versão original, o jogo consiste na proposição de duas palavras para que se estabeleça uma conexão entre elas, sendo que ou o número de conexões é dado de antemão ou o mínimo de linhas é buscado. Ex. Converter BELO em FEIO, duas conexões: BELO - SELO - SEIO - FEIO (selo e seio foram as duas conexões). Cada mudança de letra deve formar uma nova palavra existente no vocabulário, excetuando-se nomes próprios.
Esse jogo de palavras é chamado doublets, e foi inventado por Lewis Carroll, autor de Alice no Pais das Maravilhas. Foi publicado em uma revista, a Vanity Fair, em 1879, tornando-se muito popular desde então. Carroll propôs em seus livros muitos outros jogos lógicos e linguísticos.

Agora, não é que fazer esse tipo de operação de par mínimo oralmente é também uma ótima situação de consciência fonêmica? E pode, depois ser analisada na escrita também, resultando numa situação de reflexão grafo-fonêmica, muito importante para a alfabetização, pois o fonema, em especial, por ser uma unidade muito abstrata, se torna observável justamente na escrita das palavras. Mas veja que interessante explorar a supressão e substituição de fonemas iniciais em trava-línguas por exemplo: "o ato oeu a oupa do rei de oma", ou "o pato poeu a poupa do pei de poma"...Eu brinquei muito disso com meu filho!
A Ciça tem uma travatrova assim:

O RATO, O PATO, O GATO E O NONATO



O RATO ROEU A ROUPA DO REI DE ROMA,
O PATO POEU A POUPA DO PEI DE POMA,
O GATO GOEU A FOUPA DO GUEI DE GOMA
E O NONATO NOEU A NOUPA DO NEI DE NOMA.

Ciça. Travatrovas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

Léo Cunha, no livro Língua de sobra, da Ed. Cortez, traz uma brincadeira parecida com essa da Ciça:

Errata
O ato oeu a oupa do ei de oma.
O rato roeu a letra do meu poema!
O rato inventou outro idioma?
Ê, rato,
     pra que tanta
errata?

Pois é...muitos outros jogos também exploram essa ideia do par mínimo, geralmente com o fonema/letra inicial, como o Bingo Letra Inicial, do acervo de jogos do CEEL, e como as advinhas Par Mínimo que tenho aqui no acervo: 


Um jogo comercial que também trabalha com essa ideia de par mínimo é o Boggle Slam, que adoro.  Vejam aqui.


Nesse caso, a composição de pares mínimos aqui é mais complexa também, como a brincadeira que abriu esse post, pois não há comutação apenas de fonemas/letras iniciais. Mas acho mais bacana, com as crianças, jogar Boggle Slam sem isso de correr, cada um fazendo sua troca de letra na sua vez. Só com aquelas já alfabetizadas, dá para brincar com o fator rapidez valendo.

É isso, gente! 


28 comentários:

  1. LUA em SOL, achei!!!
    LUA - SUA - SOA - SOL
    Facinho!
    Bjs,
    Cris

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  2. Isso, Cris, tente PÃO - MEL...
    Lica

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  3. Pró,
    Estou tentanto, estou tentando... Uma dúvida: o à pode virar A sem contar como uma comutação? Posso, por exemplo, trocar PÃO por PAI? Mudo aí só a letra O para a letra I, mas se considerar os fonemas, mudei dois elementos nessa comutação. Se à e A são fonemas diferentes, mas letras iguais...como fazer? E aí?
    Bjs,
    Cris

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  4. Oi, Cris,
    Sua dúvida é absolutamente pertinente e interessante, e também uma boa oportunidade para mais esclarecimentos. Se considerarmos a ideia de par mínimo, que é de natureza fonêmica, de fato não podemos propor PÃO - PAI, pois estaríamos infringindo a regra principal do par mínimo, cujas palavras devem se diferenciar apenas em um elemento. Entretanto, o doublet, diferente do par mínimo, usa critérios gráficos, ou seja, a letra e não o som. Portanto, nesse caso, podemos sim propor essa comutação de PÃO para PAI.
    Mas eu achei uma solução em que o à é trocado por I, implicando em comutação gráfica e fônica, ao mesmo tempo. Continue tentando!
    Lica

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  5. Oi, pró,
    Eu achei assim: PÃO - PAI - CAI - CAL - MAL - MEL. Já que pode, achei!
    Vou continuar tentando...
    Obrigada pela resposta,
    Cris

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  6. Oi, Cris,
    Eu achei uma curtinha assim: PÃO - CÃO - CAL - MAL - MEL, trocando à e O por A e L em CÃO para CAL.
    Mas achei também uma mais longa, comutando apenas um fonema/letra em CÃO para CIO (Ã para I): PÃO - CÃO - CIO - RIO - RIM - MIM - MIL - MEL
    É divertido, né?
    Em breve vou propor mais desafios...
    Bjs,
    Lica

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  7. Oi, gente,
    No site de Ruth Rocha(http://www2.uol.com.br/ruthrocha) tem uma outra versão dessse jogo, que ela chama de "Palavas Mutantes". A variação é a seguinte: ela dá a dica para você encontrar as palavras, como em uma cruzadinha. A regra de trocar apenas uma letra é a mesma.

    Ex. Para transformar FEIA em BELA

    F E I A - Que não é bonita
    F E R A - Animal feroz
    M E R A - Simples, comum
    M E L A - Do verbo melar
    B E L A - Muito bonita

    Apesar de o caminho para resolver ser previsto, determinado de antemão, também é uma versão interessante. Podemos criar outros como esse, é uma outra possibilidade de jogar.
    Lica

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  8. Isso, José Ronaldo... outro caminho...

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  9. Gente, um jogo muito legal que tem essa lógica como mote, é o Boggle Slam, da Hasbro.
    Confiram em: http://www.youtube.com/watch?v=a6NhCnvwBrM

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  10. Uau, que ótimas dicas! La em casa ja conseguimos o pingo no i , agora vamos experimentar estas novidades apetitosas! ;-) abs, nana e marina

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  11. Que bom, Nana!!! Marinoca vai ficar ainda mais sapequinha, agora das palavras!
    Bjos nas duas

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  12. Isso, Luis Guilherme!
    Mas se você continuar com ria, chega de volta no rio, que começou tudo!
    Liane

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  13. Respostas
    1. ...continue Renata...

      ...fel-fez-tez-ter-ler-lei-sei-sai-são-pão...

      ...saiu do pão e voltou para o pão. A ideia é desafiar-se a ir mais e mais longe.
      Lica

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  14. Estou precisando de pares minimos t/k e d/g. Alguém sabe aonde consigo? Obrigada

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    1. Precisaria saber se você está considerando pares mínimos restritamente como troca de fonemas ou se está incluindo também troca de letras. Como usou o k, imagino que fonema...
      Com d/g com som de /g/ dá para encontrar alguns, Renata... como dado/gado, deixa/gueixa, dia/guia...
      Mas se vale também o fonema /j/ com a letra G, teria, por exemplo, dela/gela, das/gás...
      Se o par t/k diz respeito mesmo ao fonema /k/, como imaginei, me vem também alguns, como corta/torta, tora/cora, tato/taco...O gostoso é ir pesquisando, experimentando...
      Tente!
      Abs
      Lica

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  15. PÃO / MEL
    pão - mão - mal - mel OU
    pão - pio - mio - mil - mel

    LUA / SOL
    lua - sua - sul - sol

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  16. Pró,
    Gosto muito desse jeito que você vai misturando jogos, literatura, dica de livros, outros jogos, e conhecimento sobre alfabetização. Gosto mesmo! Nas aulas e aqui no blog.
    Bruna

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    Respostas
    1. Bruna,
      Só sei fazer assim...costurando repertórios diversos. E penso que o caminho para a formação de um professor que tenha autonomia e autoria em sua prática, é esse, além de conhecer os conteúdos do ensino e a didática, deve ter um amplo repertório para poder lançar mão dele e fazer suas costuras, sempre singulares e significativas para ele e para o grupo.
      É o que chamo de um professor rizomático, que, diferente do professor, muitas vezes desejado pelas políticas públicas, possa ir compondo os fios singulares de sua prática, de forma fundamentada, mas autoral. Nada disso de todo mundo brincando com a mesma parlenda em todos os mesmos anos de todas as escolas públicas do Brasil. E as mesmas costuras previamente feitas, apresentadas pelos materiais previamente concebidos, imposta a todos os professores como único caminho de costurar repertórios.
      Repertório não é tudo, mas é muito! E com eles, aprender a costurá-los vem de brinde, se bem provocada a costura.
      Quero ser uma formadora de professores assim, que provoca vocês a serem professores rizomáticos, sendo eu também.
      Abraço

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  17. Respostas
    1. Com as palavras deve ser mais fácil do que com as pessoas...Tente!

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