segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Galeria PNA - Política Nacional de Alfabetização em gêneros diversos

 Olá, gente,

Tenho estado pouco por aqui, mas volto para postar as produções dos estudantes do componente EDC B85 - Alfabetização e letramento, nesse semestre suplementar da FACED/UFBA, em tempos de pandemia. O semestre suplementar, remoto, foi o que a UFBA definiu como retomada no período de isolamento social, devido à Covid 19. O semestre foi de muitos desafios e celebramos essas produções como conquistas importantes entre o acolhimento desses desafios e o desejo e necessidade de não comprometer o aproveitamento dos estudantes, de assegurar um semestre produtivo, ainda que com todas as limitações. Conseguimos! Mas nem todos. Alguns ficaram pelo caminho, por razões diversas - não podemos esquecer disso ao constatar que conseguimos e celebrarmos -, então essa conquista ganha outros contornos também. Soubemos reconhecer essa realidade.

Bom, mas como não poderia deixar de ser, nesse semestre, discutimos no componente também a situação da alfabetização na pandemia. Lemos artigos, matérias, assistimos a lives e fizemos levantamento de desafios do período quanto à alfabetização, em especial. Um dos trabalhos de avaliação que definimos para o componente foi realizar uma breve pesquisa junto a docentes quanto aos desafios que tiveram, as estratégias de que lançaram mão para transpor tais desafios e as estratégias didáticas e plataformas que têm as/os ajudado nesse contexto. Ao final, os estudantes categorizaram seus dados e apresentaram, oralmente, em momento síncrono, os seus resultados. Não conseguimos tratar os dados em conjunto, durante o semestre, como queríamos de início, mas entre o zelo com as dificuldades do período e as possibilidades, deu ao menos para termos uma ideia de tendências em termos desses desafios e estratégias. Vimos desafios semelhantes e diferentes implicados em situações relatadas por docentes de escolas particulares, escolas públicas e instituições que lidam com crianças com deficiências, com suas particularidades. Vimos desafios mais amplos, coincidentes com o vivido em geral no ensino remoto, e desafios específicos do processo de alfabetização. Vimos algumas estratégias docentes para driblar esses desafios e alfabetizar as crianças, e conversamos muito das contradições envolvidas em tudo isso que envolve o ensino remoto nesse período de pandemia. As apresentações ficaram sob a batuta de Dionei, Fernanda e Geovana, Helena, Jeane, Jolfer, Keyla e Marina. Thailcy preferiu apresentar o trabalho por escrito. 





Para acessar os slides das apresentações, veja a pasta no Drive aqui. ATENÇÃO! Para visualizar adequadamente as apresentações, colocar os arquivos em PowerPoint em modo Apresentação de slides.

Demos essa opção de trabalho de avaliação do semestre (dentre outros dispositivos, como participação nas atividades do AVA) ou a opção de se debruçarem nos estudos sobre a PNA - Política Nacional de Alfabetização, e seus programas derivados (Conta pra mim e Tempo de Aprender). Ambas as discussões que fizemos (com a turma toda) dessas temáticas, bem como o aprofundamento em uma ou outra para realizarem os trabalhos, articulam-se a nosso estudo sobre concepções de alfabetização, articulado às políticas e práticas alfabetizadoras. Ainda que a discussão parta da perspectiva de alfabetização que tomo como referência, por convicção eu acredito que seja importante, nesse componente, trazer um panorama do campo de concepções, que se apresentam numa dinâmica de disputas e diálogos, em vez de assumir apenas um ponto de vista. Assim, busco apresentar a temática da alfabetização e do letramento no contexto das disputas conceituais em torno desses conceitos, mas sempre entendendo a apropriação da escrita alfabética como a apropriação de um instrumento cultural potente, como nos ensina Vygostky, no contexto de uma cultura escrita. E buscando um modo de abordagem em que o campo conceitual, epistemológico, político e didático se articulem. 

Aliás, abrindo um parêntese, é importante ressaltar que o tempo é curto para tanto. Muito curto. O componente merecia carga horária maior no curso de Pedagogia, inclusive porque, também por princípio, acredito ser fundamental maior dedicação, igualmente, à dimensão didático-pedagógica, na perspectiva da formação para a docência em alfabetização. Por ora, nas disputas por espaço no currículo do curso, temos apenas esse componente obrigatório de alfabetização. 

No contexto dessa discussão e articulações, fomos estudar a PNA, sua vinculação com a ciência cognitiva, o método fônico, a literacia entendida como habilidades inidividuais e banimento da dimensão sociocultural da alfabetização, bem como fomos analisar seus programas de implementação. Alguns estudantes se dedicaram ao próprio Caderno da PNA, outros ao programa de literacia familiar Conta pra mim e outros fizeram o curso para docentes do programa Tempo de Aprender, para trazer para o grupo alguma reflexão nesse sentido. Inspirando-nos na AULA ABERTA que realizei junto com a turma de 2019.1 e também em nossas discussões sobre gêneros no processo de letramento, a proposta foi materializarem seus estudos e críticas sobre a PNA em gêneros textuais diversos, unindo reflexão e criatividade, crítica e deleite, siso e riso

São esses trabalhos que apresentaremos nesse post. Diferente dos textos da Aula Aberta de 2019, que foram produzidos ainda no início da decretação da PNA, aqui já temos análises dos programas de implementação dessa política. Na turma de 2019.1, fomos olhar o site do Secretário de Alfabetização nomeado e, depois, o Decreto de abril 2019. Ainda não havia o Caderno da PNA. Os textos daquela ocasião refletem isso. Mas agora as produções trazem outros elementos em suas paródias de gênero.

Vejam que há, inclusive, hibridismos vários - é um trabalho acadêmico, que traz o formato de algum gênero discursivo e suporte, veiculado em outros suportes e que, no final das contas, têm suas funções sociais originais deslocadas para dar lugar a essa função: revelar, numa perspectiva crítica, o que aprenderam sobre essa política, sobre concepção de alfabetização, sobre alfabetizar e letrar.

Vamos aos textos? São contos, cartas, contos em forma de cartas, tirinhas, canção, bula de remédio, arquivo confidencial, aplicativo... artigo de opinião em jornal, entrevista em revista... Como a turma foi menor e se dividiu em mais de um trabalho, não são muitos os textos, mas estão no capricho! Mas até que tem bastante! Vamos conferir?

Para começar, de onde sempre se parte, entramos no Reino Analfabeto. Nesse reino, somos apresentados ficcionalmente à PNA, Tempo de Aprender e Conta pra mim, ou seja, à política e a seus programas derivados. Conto de Emanuelle Cavalcante:

Para visualizar no Drive, clique aqui.

Mas esse conto ficcional parece que aconteceu de verdade, não? Algumas matérias em jornais, sites e revistas já começam a divulgar mais sobre a PNA e o que tem por trás dessa política e seus programas de implementação. Com esse artigo de opinião em um jornal especializado em educação, de autoria de Tamires, os princípios e intenções da PNA vão se tornando claros, a partir de um estudo comparativo de dois documentos de governos diferentes. O neoliberalismo e a mercantilização da educação estão presentes nas políticas de alfabetização muito antes do governo atual, e se alastram num crescente que, juntando-se ao conservadorismo desse governo, vemos interesses e desmontes que vão muito além dos interesses mercantis. 

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A situação vai ficando tão complicada que lançaram até um medicamento. A farmacêutica responsável, Maria Victória, garante que, com esse medicamento, tudo ficará esclarecido e o governo poderá ser responsabilizado pela administração irrestrita da droga na população. 

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A PNA, tendo até um remédio desses, já avançou em programas visando à sua implementação. O primeiro foi o Conta pra mim, que gerou muitas críticas, especialmente entre pesquisadores do campo da literatura, da formação leitora e da alfabetização - nenhum autor e pesquisador desses campos foi convocado ou consultado para dar seu parecer sobre tal proposta. Mas  o lançamento do programa gerou também muitos elogios por parte de famílias (de classe média, média alta) e docentes (muitos deles, bastante desavisados). Não foram poucos que, desavisados,  sem perceber a falácia, "compraram" a ideia por suas premissas inquestionáveis, mas outros porque são alinhados mesmo a esse tipo de literatura utilitarista, usada para ensinar e moralizar, bem a cara da perspectiva  ideológica subjacente. E não são poucos os toscos que questionam os que criticam o programa usando esse argumento: "como assim, estão questionando os pais lerem para as crianças?". Seria absurdo, exatamente. Não estamos questionando essa premissa, usar esse argumento é querer fechar questão, e é admitir que a premissa louvável justifica o programa tal qual ele se apresenta. Vamos ver que aspectos são esses que se questiona? 

Em reação a uma carta institucional do MEC quanto ao programa, tanto professoras quanto famílias se manifestaram e algumas manifestações foram em forma de cartas. Veremos agora essas cartas, organizadas por Celly, Geisiane e Heloísa. Para começar, a carta do MEC que gerou as reações.

Se não conseguir dar zoom nas imagens, acesse no Drive as cartas do MECprofessoras e mãeem pdf, com maior legibilidade.



O link para a fala da primeira dama apresentando o Conta pra mim, citado na carta, é aqui.

As reações ao lançamento do Conta pra mim e a essa carta vieram de escolas, professoras, famílias. Muitos elogiam o programa, porque ele parte, justamente, de premissas inquestionáveis: ler para as crianças é uma prática muito importante e as famílias e, quando são famílias letradas, constituem uma agência importantíssima de letramento. Acontece que é muito simplório achar que prescrições de um programa, que depende de condições não garantidas a uma grande maioria de famílias às quais o programa supostamente se dirige, vai ter um impacto substancial - ainda mais com um viés instrumentalizado das interações sociais e um uso utilitário da literatura. As crianças de famílias com poucas condições de inserir as crianças nas práticas letradas precisam é que as escolas garantam o letramento, as experiências ricas e diversificadas com a cultura escrita. A escola pode, inclusive, mediar melhor a relação de famílias com baixo grau de letramento com a leitura das crianças. Mas, ao que parece, é justo o que eles não querem, né? Querem a relação direta família-criança, minimizando o papel da escola. Por que será, né? Estamos sob a égide de um governo extremamente conservador e ideológico, o que podíamos esperar de um programa assim? Mas, ao que tudo indica, nem todos os docentes e nem todas as famílias caíram nesse conto da carochinha, muitos conseguem ver além das premissas inquestionáveis que nublam nosso espírito crítico diante de tantas falhas!

Nesse sentido, o trio Celly, Geisiane e Heloísa, registrou aqui a carta de um coletivo de professoras alfabetizadoras, baianas, mulheres, guerreiras e que firmam um compromisso com a educação de qualidade, a especificidade de sua função profissional, defendendo sua autoria e autonomia docente. Ressaltam, ao lado da apropriação da linguagem como forma de interação social, o valor da literatura, cultura e arte na vida e na formação de sujeitos. 

Viva essa professora! Vivas as muitas professoras que fazem a diferença! 

Mas além das professoras, famílias também manifestaram suas inquietações. Se você se reconhece naquelas casas de revista, arrumadas, cheias de móveis bonitos, obras de design, com lareira, quartos amplos, camas aconchegantes, famílias bem vestidas, talvez não veja a incoerência da mesma forma que famílias muito distantes dessa representação idealizada de família, muito longe da realidade de nosso país. Era pra ficar bonito, né? Pois...taí a contradição...uma delas... Tem muitas! Veja essa carta de uma mãe que dá muito valor à alfabetização de seus filhos, a despeito - ou por isso mesmo - de não ser alfabetizada. A valorização da escrita e de seus usos na sociedade também é um fator de letramento, como discute a Silvia Terzi, em um artigo na nossa Revista da FACED, hoje entreideias. A carta dessa mãe desvela certos aspectos de um programa que se diz voltado para famílias pobres e em vulnerabilidade social e, no entanto, tais famílias não se reconhecem nele.


É tão interessante observar, nesse post e nessa proposta metatextual, como os gêneros vão contando de forma diversa sobre a temática, não é? Aqui, as diferentes cartas têm diferentes formatos, linguagem, formas gráficas, graus de formalidade e, fazendo um comentário metagenérico, ainda trazem a polifonia de vozes diversas que falam nelas, não é? Vozes do enunciador das cartas, vozes das estudantes que as bolaram, vozes da docente (eu), que conduziu as discussões e estudos e revisou os trabalhos, vozes que embaralham a formalidade e a ironia, a informalidade e a crítica. Nesse sentido, a carta do MEC bem que poderia ter uma tarja de "contém ironia", né? 

Além de indignação, reações críticas e pequenas doses de ironia, o Conta pra mim também despertou a ironia na essência, já que vem em forma de tirinhas, gênero que tem a ironia como um aspecto fundamental. Vamos ver as tirinhas de Emanuelle Francine? Fala de outro jeito o que falou Lúcia na sua carta.



Ursinho leitor? Tem!


Mas esse assunto todo gerou uma investigação policial que parece até que tem um quê de confidencialidade, não é? E seguimos aqui revelando, em primeira mão, o arquivo ultra secreto, cuja investigação está sob responsabilidade de Érick. A ideia maravilhosa foi dele, mas quase queria desistir! Não deixei! Ainda bem, né gente? Um empurrãozinho, e olha que essa investigação parece até que está rolando mesmo e deixando o MEC preocupado...







Que essa investigação corra com celeridade! 

Até aqui vocês já perceberam que gêneros diferentes falam de formas diferentes e, por vezes, dos mesmos assuntos, não é? Mesmo se definimos um conteúdo, há diferenças de formato, enunciados, construções sintáticas, elementos coesivos, informatividade, modalização, léxico (esse arquivo secreto traz termos desse universo investigativo que marcam muito o gênero, percebem?). O gênero compõe-se de tudo isso. E, sem esquecer que o determinante para caracterizar um gênero é a sua função social, criamos um dispositivo que nos ajuda a pensar ao mesmo tempo na temática da PNA e o campo conceitual do nosso componente, nas características formais e funcionais de alguns gêneros discursivos, seus hibridismos, e até mesmo nessa nossa capacidade metagenérica, que nos permite saber sobre as marcas desses gêneros, só pelo uso ou conhecimento deles nas práticas culturais e sociais. E é por isso mesmo que podemos "brincar" de fazer arquivo confidencial sem ser,  de bula sem ser, de aplicativo sem ser, ou seja, brincar com a forma, sendo a função, em último caso, sempre ligada a nossa reflexão sobre as políticas de alfabetização, que estamos analisando com olhos críticos. Um aprendizado e tanto!

Nesse sentido, vamos ao deleite musical! Apresento um livro de letras, cifras e partituras, que na verdade é um Songbook de paródias. Além de dizer o que quer dizer, ao seu modo, para parodiar uma canção é preciso também transformar palavra dita em palavra cantada, cuidando da frase melódica, da métrica, para a letra caber minimamente na melodia da canção original. Degustaremos uma das paródias do Songbook, a de Suylan, da canção Wave, de Tom Jobim.

Para visualizar no Drive, clique aqui.

Bom, mas se você ainda não está convencida/o de que tal política e tais programas merecem esse olhar crítico em muitos gêneros, se ainda tem dúvidas, e se ainda tem fôlego para um pouco mais de ironia, pesquise nas lojas virtuais e instale o aplicativo PNA, desenvolvido especialmente para você que está hesitante entre a crítica, ferrenha ou irônica, e a aceitação plena da política de alfabetização e suas materializações nesses programas. Após baixar o App, leia os termos e condições de uso, especialmente a parte das responsabilidades. A responsável técnica, Alba, orienta a não usar o aplicativo se não estiver ciente desses termos.

Para ver mais legível, em Pdf com maior resolução, clique aqui. Será que as letrinhas pequenas são de propósito para aderirmos sem saber onde estamos nos metendo?





Além do Conta pra mim, como no aplicativo fica claro, há também o programa Tempo de Aprender, outra ação de implementação da PNA, igualmente citada em outros textos - aliás, desde que apresentamos o reino analfabeto! Vamos entender mais sobre isso numa entrevista de Cleidiane, da Revista Tic's da Pedagogia, ao colega Walisson, que fez uma parte do curso de formação, parte desse programa, para nos contar de suas impressões. 

 

Para visualizar no Drive, clique aqui.

Para fechar, Vanessa embaralhou gêneros e saiu um conto distópico de mistério, em forma de e-mails e que deixa no ar a provocação quanto a nossa responsabilidade como docentes ou futuros docentes, para que possamos ser a resistência, como aquela que se esboçou no Reino Analfabeto. Abra o arquivo e dê zoom para ler melhor.

Para visualizar no Drive, clique aqui.

É isso, gente! Essa é parte de nossa produção no componente esse semestre. Espero que tenham gostado! Se você gostou e não viu o post da Aula Aberta que aconteceu em outra turma, em 2019.1, e na qual nos inspiramos para as produções desse semestre, confira aqui! Outros semestres virão, quiçá novas produções, pois não nos deixaremos ser robôs, a criatividade é infindável, a linguagem é viva e se dispõe a nós para que façamos mundos com ela. Somos humanidade, precisamos da arte, da cultura, da crítica, da justiça social, da participação plena na cultura oral, escrita, visual, digital, precisamos da linguagem viva e cheia de graça. Mesmo pra falar de coisa séria, muito séria!

Abraços a vocês leitores(as), fiquem bem e sigamos aguerridos por um mundo melhor, por uma educação para todos e comprometida com a justiça social, e por uma alfabetização bem diversa da que está posta na política desse governo.

E a vocês, estudantes, deixo um bilhetinho: