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sábado, 17 de novembro de 2012

Histórias cumulativas e a leitura

Como prometido, vamos falar um pouco sobre o trabalho com as histórias com repetição e acumulação na apropriação da leitura, já que esses são gêneros que, além de muito indicado para os pequenos, são também privilegiados nesse sentido. Entremeado a essa reflexão, vou mostrar um kit de materiais da história “Ah, Cambaxirra, se eu pudesse...”, de Ana Maria Machado, confeccionado por Ana Antunes e seus alunos.


Evidentemente, antes de qualquer trabalho com foco na reflexão sobre a linguagem, importam as histórias em si mesmas, sua natureza literária. Seja de tradição oral ou escrita, o foco primordial é a história, a graça ou encantamento que elas trazem. As histórias com repetição ou acumulativas têm esse quê de brincadeira com a retomada repetitiva de frases e situações e com a embolação acumulativa, que agrada muito às crianças, se bem lidas ou contadas.

À medida que o professor propõe às crianças a leitura ou a contação de contos desse tipo, elas vão constituindo um repertório de textos conhecidos, fazendo articulações entre contos diferentes, observando semelhanças e diferenças e se apropriando da estrutura repetitiva que os caracteriza. Isso Ana bem percebeu em sua turma! Já podem até criar uma história acumulativa, já pensou, que legal que deve ser pensá-la?! Pois bem, essa é uma possibilidade... pensar na situação, nos personagens, de que jeito vão ser repetidas ou acumuladas as ações...e o desfecho...e a professora ir escrevendo, relendo, todos opinando, até que fiquem satisfeitos. Fica a dica! Mas é preciso, primeiro, ouvir várias histórias desse tipo.

Bom, e o que essas histórias têm de especial no trabalho com a leitura? Após um elemento desencadeador da narrativa, um mesmo evento ou situação semelhante se repete várias vezes, se acumulando ou não. As ações ou situações anteriores vão sendo retomadas a todo o instante e, nas acumulativas, a cada repetição, agrega-se mais um elemento, resultando numa longa enumeração. Ora, essa estrutura facilita a antecipação das crianças do que virá em seguida, permite que repitam oralmente as ações anteriores que se repetem ou se acumulam, o que possibilita a retenção do enredo da história, de formas linguísticas, de trechos. O enredo, muitas vezes bem simples, tem um ritmo também repetitivo, favorecendo essa memorização. Isso vai facilitar diversas práticas, como veremos.

Mas não são somente as crianças que podem memorizar a história, não! Devido a sua origem como narrativa oral, é interessante que algumas histórias acumulativas sejam contadas de memória, sem o texto escrito, com toda a vitalidade e colorido da contação, especialmente aquelas da tradição oral. Experimentem, por exemplo, contar o Macaco e o Rabo! Para isso é preciso ler várias vezes, se apropriar da história, fazê-la sua! E aí sim contar para as crianças sem o livro. Como é um conto da tradição oral, você pode contar do seu modo, com suas palavras, mantendo o enredo e a estrutura da acumulação. No post anterior tem um vídeo com a história. Veja aqui duas versões desse conto: O Macaco e o Rabo. Encontre o seu jeito de contar!

Mas como contar de memória nem sempre é possível – pois para isso quem conta deve se sentir à vontade para narrá-la oralmente sem o apoio do livro – então, mesmo quando lida oralmente pelo professor, é fundamental que a leitura seja viva, cadenciada, atribuindo ao texto o ritmo que a oralidade lhe daria, enfatizando o seu encadeamento. E a familiaridade com o texto – ainda que não memorizado completamente – é essencial para se conseguir esse efeito. Esse cuidado é importante não apenas para não tornar a leitura monocórdia, monótona, sem ritmo – o que na história acumulativa, especialmente nas que se assemelham a uma longa parlenda, é um risco ainda maior e estraga a história – mas também para restituir-lhe a sua natureza oral. Aliás, qualquer que seja o gênero de texto, a leitura compartilhada, como a contação, exige sempre uma preparação.

Ana lendo para a turma
Assim, é necessário preparar-se para ler, para contar, ensaiar a leitura oral, o ritmo, explorar as nuances do texto, experimentar modos de ler e de contar que cativem as crianças e prendam a sua atenção... Há trechos que podem ser lidos de forma mais lenta, outros que demandam uma leitura mais rápida, como, por exemplo, quando a acumulação se inverte... E, assim, ensaiando, você poderá tanto restituir bem, pela voz, a oralidade do texto escrito, quanto ler para as crianças sem estar com os olhos grudados na página a todo o momento, já que há trechos repetidos que podem ganhar vida com gestos e olhares mais presentes, que busquem e capturem os olhares das crianças. O leitor aí se coloca um pouco como contador, que busca para si a atenção, não a centralizando apenas no objeto livro.

É comum que depois de ouvir alguns trechos da história, as crianças também comecem a enunciar as frases que se repetem e se acumulam no texto, participando da narração e dando-lhe vida. O modo como essas histórias se organizam favorece a participação mais autônoma das crianças na leitura, permitindo que antecipem os acontecimentos, memorizem gradativamente o texto e compartilhem a leitura, mesmo antes de ter o domínio da leitura autônoma. E isso será importante para a apropriação dessa autonomia. As ilustrações – no caso de leitura de livro – geralmente ajudam a fazer tais antecipações.

Mas não se iluda! Como se retoma sempre os eventos anteriores e agrega-se a eles um elemento novo, para avançar, estão presentes no texto tanto a repetição, o reconhecimento de uma situação, quanto a novidade, garantindo assim o desenvolvimento do enredo. E, no final, a surpresa! Lembre-se de dar um colorido especial à leitura do trecho final, em que se introduz na história a novidade que faz o rumo da acumulação parar, inverter ou prometer nunca acabar... Observe que entonação, pausas e silêncios podem ajudar a ressaltar a graça, a surpresa, o sentido da história.

Outra coisa interessante é que, pelo fato de as repetições e retomadas se darem por expressões de linguagem, esse gênero de texto pode apresentar também jogos verbais lúdicos, muito interessantes tanto do ponto de vista de uma boa interação com os ouvintes, quanto para o trabalho com a oralidade e a escrita: expressões e palavras repetidas, onomatopeias, trocadilhos, rimas etc. Esses recursos podem, em um momento posterior, favorecer a reflexão sobre os sons da língua e a observação das relações entre a linguagem falada e escrita. E, durante a leitura, dão vida ao texto e à interação entre leitor e ouvintes.

Assim, além de divertir e encantar as crianças, função primordial da literatura, as histórias com repetição e acumulação ajudam a desenvolver a oralidade e as aproxima da leitura. A estrutura de repetição, acumulativa ou não, torna mais fáceis a leitura e a compreensão da história, bem como possibilita a recuperação de sua estrutura narrativa e de suas formas linguísticas. Em si, a memorização de parte ou de toda a história, facilita o reconto, a pseudoleitura, práticas interessantes de apropriação da língua escrita e da leitura.

Por lançarem mão de um recurso muito interessante para a compreensão e a memorização do texto, livros com histórias com repetição e com acumulação favorecem a leitura interativa – as crianças ajudando a enunciar o texto em trechos que se repetem – e a leitura autônoma (pseudoleitura) pelas crianças, pois elas podem experimentar modos de ler um texto, com apoio da memorização e nas ilustrações, antes mesmo de dominar a leitura.

Como já dito, as situações de leitura interativa, participativa, convidam a criança a assumir o papel de leitora antes de saber ler com autonomia. Quando o enredo é mais elaborado, elas podem assumir esse papel em determinados trechos, que trazem a repetição e acumulação, enquanto o professor lê as outras passagens.

Na leitura autônoma, além de enunciar o enredo do jeito que lembram, elas expressam procedimentos de leitura que aprenderam observando quando leem para ela, a exemplo da entonação, o passar das páginas, o tipo de linguagem do gênero ou do texto específico, a varredura do texto pelo olhar da esquerda para a direita, dentre outros procedimentos de leitura. A leitura de livros para e com as crianças ou por elas próprias são situações muito importantes de aprendizagem de procedimentos e comportamentos leitores, de colocar-se como leitor.

Além da leitura compartilhada ou interativa e da contação, a estrutura repetitiva e acumulativa se presta bem também a propostas como coro falado e encenação, animando leituras coletivas.

Recontar a história, por sua vez, preservando suas características, a sequência e o enredo, é uma atividade igualmente muito produtiva de organização textual, de compreensão leitora, de aprendizado das características do discurso escrito (ainda que trazendo marcas de oralidade). O reconto, assim como a pseudoleitura, que são importantes situações de apropriação da leitura, são possíveis graças ao apoio na memorização da história, sua sequência, sua estrutura. No caso dos livros, apoio também nas ilustrações.

Materiais para apoiar o reconto e refletir sobre a escrita

Além das próprias ilustrações dos livros, alguns materiais podem ser criados para ajudar na recuperação da sequência da história, permitindo às crianças a recontarem ou se arriscarem a ler mesmo que ainda não o façam de modo convencional. Fichas com as figuras ou com nomes dos personagens e/ou ações, objetos e outros elementos próprios a cada história podem servir como apoio à recuperação dos personagens e ações sucessivas encadeadas. Como nas histórias acumulativas é frequente ter vários personagens que vão se sucedendo uns aos outros, com ações que vão se encadeando, para apoiar a recuperação da história e seu reconto, esses recursos são muito úteis, como venho ressaltando nos posts das várias caixinhas de livros.

As crianças podem, com ou sem a ajuda do professor, a partir do reconhecimento dos personagens representados nas ilustrações das fichas ou mesmo escritos, ordená-las na sequência de entrada dos personagens na trama e, depois disso, tentar recuperar o texto, de forma aproximada. Aos que ainda não têm recursos para tentar reconhecer as palavras das fichas por estratégias diversas, podem ser dadas as fichas com as ilustrações. Mas para os que já podem tentar reconhecer as palavras ou parte de palavras, através de estratégias diversas e do conhecimento que têm de letras e relações entre letras e sons, ainda que este seja um enorme desafio, terão uma boa tarefa de reflexão pela frente para conseguir montar a sequência dos personagens para, então, fazer o reconto, apoiar a recuperação do enredo.

Como venho insistindo em vários posts, a atividade de reconto - reconto oral ou reconto para produzir uma reescrita - são oportunidades muito interessantes de usar as palavras para apoiar essa reconstituição, em uma atividade que é a um só tempo de letramento e de reconhecimento de palavras, de reflexão sobre o sistema de escrita, já que exige que as crianças façam relações para descobrir onde está escrito o quê, usando seus conhecimentos sobre a escrita.

Mas além de apoiar o reconto, os nomes dos personagens escritos podem servir para várias atividades de reflexão sobre a língua escrita, nas quais está em jogo pensar nas relações entre a pauta sonora e gráfica. As fichas com figuras podem ser associadas, pelas crianças, às fichas de palavras, ou podem ser usadas para se jogar como jogo da memória, baralho, sempre emparelhando, associando, a ficha da figura com a ficha do nome correspondente. Além disso, pode-se propor a montagem desses nomes com letras móveis, com ou sem o apoio de fichas “faltando letras”, constituindo-se, nesse caso, em atividade de escrita, não de leitura. 

Estas são atividades que exigem pesquisa inteligente, uso de estratégias, comparação de pedaços das palavras com outras, já conhecidas, como os nomes próprios das crianças da sala, por exemplo. No reconhecimento de palavras está em jogo tanto a leitura mais global das palavras, que favorece a ampliação do repertório de modelos estáveis de escrita convencional, quanto a ativação de estratégias de leitura por parte das crianças, exigindo que usem o conhecimento que têm disponível sobre letras e sons, partes de palavras, para resolver o que ainda não sabem com autonomia. As letras finais e inicias das palavras, a presença de algumas vogais ou mesmo consoantes, o tamanho das palavras, uma sílaba que é reconhecida, comparada a um nome próprio, tudo isso pode constituir em elementos para as reflexões das crianças.

No material abaixo vocês podem observar essas fichas. Os personagens foram desenhados tendo por base as ilustrações do livro.



Esse material, como vocês podem observar, foi desenhado por crianças. Então, essa foi um ideia que tive e que Ana desenvolveu em sua turma, a partir da história Ah, Cambaxirra, se eu pudesse... Falando com ela sobre desenvolver um kit de materiais a partir de histórias acumulativas, sugeri que as próprias crianças fizessem o desenho dos personagens. Eu sempre quis ter um material ilustrado pelas crianças e sugiro isso sempre aos professores que confeccionam seus materiais nas oficinas. Ana gostou da ideia e fez um trabalho muito bacana com a turma dela de 1º ano. Esse é o material que aparece nas fotos com as crianças. Na foto acima aparecem fichas do kit que fiz para Joaquim, a partir dos desenhos das crianças de Ana.

Para seus alunos, que, em sua maioria, já sabiam ler, o mais gostoso e produtivo foi mesmo toda a preparação do material. Mas é Ana mesma quem conta sobre esse processo, em um texto que pode ser lido aqui


Assim como o nome dos personagens, outras palavras e expressões que marcam o texto – como as suas ações, seus qualificativos, caso haja isso no texto, os objetos que carregam, quando é o caso – podem ser escritas em outras fichas para ajudar a reconstituição da história, a recuperação de sua sequência, e também serem usados em jogos de emparelhamento.

As três fichas do kit
A história Ah, Cambaxirra se eu pudesse... inspirou o grupo de Ana a criar um outro conjunto de fichas, dessa vez com elementos definidores de cada personagem, que foram selecionados para facilitar o reconhecimento dos desenhos. Nesse caso, esses elementos não estavam na história, no texto, mas foi um recurso usado para facilitar a caracterização de cada personagem, alguns dos quais são muito parecidos: lenhador, capataz, barão, duque, marquês, conde, visconde, imperador...caracterizados pelos seguintes elementos: camiseta, camisa, blusa com babados, capa, casaco, túnica, chapéu, coroa.

Assim, surgiram também as fichas com esses marcadores escritos, criando-se, assim, a possibilidade de associar as fichas com os personagens desenhados, as fichas com seus nomes escritos e as fichas com esses marcadores. Um jogo de trinca!

Em outras histórias, aparecem já no texto elementos que podem compor fichas do kit. Há contos em que cada personagem carrega um objeto ou cada personagem faz uma ação. Esses objetos e ações podem também compor conjuntos de fichas, tanto para favorecer a reconstituição do texto pelas crianças, as sequências, o que vai com o quê ou faz que ação, quanto para serem associadas entre si: cada imagem do personagem associado ao seu nome, ao seu objeto ou ação, e assim por diante. Quando há ações ou qualificativos associados a cada personagem, novas palavras podem, assim, surgir no kit de materiais. No conto o Macaco e o rabo, por exemplo, podem ter fichas com o desenho e outras com a palavra leite, capim, sapatos, cerdas, e assim por diante...

Outra coisa interessante é quando na história enumerativa há, de fato, números – por vezes há, como em “O nabo gigante” e “E o dente ainda doía”, dentre outros – os algarismos (5) e os numerais escritos (cinco) podem também compor o kit, em fichas escritas. Na coleção de livros com histórias acumulativas de Ana Maria Machado (mostrada no post anterior, sobre o tema), tem duas histórias enumerativas: “O domador de monstros” e “Uma boa cantoria”.

Memória nome-figura
Em kits de materiais desse tipo, as fichas com os nomes dos personagens e de outros elementos da história podem ser usadas para outras tantas atividades, como fazer comparações de palavras, apoiar a escrita, compor trem de nomes, preguicinha, dentre outras propostas. Enfim, as possibilidades são inúmeras. Cada história se presta a diferentes propostas, cada uma pode constituir um kit diferente, com propostas e materiais semelhantes e outros bem peculiares àquela história específica. Nesse kit da Cambaxirra, Ana trabalhou com três tipos de ficha, que podem ser associadas duas a duas ou em trios.

Interessante também é quando há, no conto, situações que, ao final, se invertem, pois novas reorganizações da ordem das palavras – ou mesmo novas palavras para o kit – podem ser propostas. Por exemplo, na "Casa Sonolenta", bem como na história "A Velhinha Maluquete" e no "Por que o caranguejo não tem cabeça", “A história da coca”, dentre outras, a ordem, ao final é invertida. Os dorminhocos que se acumulam na cama aconchegante da casa sonolenta começam a acordar, de um em um, invertendo-se a ordem, com novas ações dos personagens. Quem dormia leva um susto, e vai acordando: a pulga acordada pica a rato, que assusta o gato, que arranha o cachorro, que cai no menino, que dá susto na avó, que quebra a cama...  

Em termos de apropriação do sistema alfabético, além de toda a reflexão que a tentativa de reconhecimento de palavras põe em jogo, vale ressaltar ainda que histórias com palavras, frases e trechos repetidos e acumulados favorecem a observação de aspectos qualitativos e quantitativos da escrita, de algumas regularidades da organização da escrita que, embora óbvias para um leitor proficiente não o é para os que ainda não leem com autonomia. Como exemplo, podemos citar a relação entre a quantidade de ações que vão se acumulando e a quantidade de texto escrito (na “Casa Sonolenta”, o texto vai aumentando a cada personagem que se deita na cama, uns por cima dos outros); a observação do que muda e do que permanece em enunciados que se repetem (repete-se a frase, mas muda-se o personagem, por exemplo, como em “Bruxa, Bruxa”, dentre outros); que palavras iguais escrevem-se da mesma maneira, com a mesma sequência de letras; que há espaços entre as palavras e a própria ideia do que é palavra; que tudo o que se diz ao ler está escrito e na mesma ordem que se enuncia, dentre outros aspectos.

Assim, por meio de textos desse tipo, é possível estruturar atividades que permitam diversas ordens de apropriações e a construção de diferentes conhecimentos ligados à oralidade, à escrita e à leitura, tanto no sentido amplo do letramento, quanto na alfabetização propriamente dita. Além disso, não podemos perder de vista o aspecto de brincadeira que esses textos trazem. Brincadeiras com a linguagem...

Jogar com as palavras que povoam as histórias pode ampliar a leitura ou matá-la, tudo depende de como se faz... e, por isso, nessas propostas, é fundamental não perder nunca de vista os aspectos literário e lúdico, centro de toda a potência da leitura literária...

Aliás, por falar em brincar, quem não se lembra daquela brincadeira acumulativa que é “Fui à feira e comprei...”. Cada um vai dizendo uma coisa que comprou e o jogador seguinte deve repetir a dos jogadores anteriores e acrescentar a sua compra...e assim por diante... Se colocarmos um critério sonoro nessa brincadeira, a exemplo de outra brincadeira parecida que é a “Lá vai a barca carregadinha de...”, podemos então fazer uma feira de rimas, como por exemplo: “Fui à feira e comprei pão”... “Fui à feira e comprei pão e feijão...”...”Fui à feira e comprei pão, feijão e agrião”... Ou uma feira de sons iniciais... E assim, essa brincadeira acumulativa já se constitui em uma ótima atividade de reflexão fonológica. A “Lá vai a barca carregadinha de...” já é em si fonológica, na medida que o objetivo é, justamente, levar na barquinha palavras que tenham alguma semelhança fonológica (rimas, sílaba inicial, fonema inicial etc) com as ditas anteriormente, cada um dizendo uma, completando a barca: “Lá vai a barca carregadinha chaves, xales, xícaras, chuchu, chuva, cheiro, chaveiros, chiclete...”

Bom, para finalizar, por ora, adianto que estamos pensando em fazer uma série de kits de histórias acumulativas, com textos e materiais, iniciada com o “Ah, Cambaxirra se eu pudesse...”. Não sei se formarão kits diversos ou se depois juntaremos em um grande kit acumulativo. E quero investir mais – através de minhas parceiras, já que não estou em sala de aula - nas fichas com as próprias ilustrações das crianças, a partir dos contos acumulativos lidos e trabalhados. Vamos ver, aos poucos, o que sai.

Como alguns de vocês sabem – através das oficinas e aqui no blog – esse tipo de história repetitiva e acumulativa faz tempo está no meu repertório de materiais para alfabetização a partir da literatura e da tradição oral. Com o Projeto Trilhas, essa paixão antiga foi renovada, pois dois dos cadernos do projeto referem-se a isso, o Caderno das Histórias com Repetição e o Caderno das Histórias com Acumulação. Os dois cadernos, que estão na biblioteca do Portal, trazem algumas propostas de atividades a partir desses gêneros. É só acessar: 


As propostas desse post e as dicas de livros do post anterior sobre histórias acumulativas podem perfeitamente se articular com as propostas do Trilhas, para as escolas que estão desenvolvendo o projeto. É uma dica!

É isso, gente. Logo mais continuo esse post com outros relacionados a ele: o dos Tangolomangos, que já está quase pronto, e um que já prometi há tempos, da Caixinha do livro A Casa Sonolenta, já bem antiga no meu acervo. Tão antiga que até pensei que já tinha feito o post. Rsrsrs!!! Mas as fotos vocês já viram, para que não a conhece ao vivo e a cores, né?

E no mais, aos poucos, vou mostrando outras caixinhas de livros do kit de acumulativos que, com certeza, chegarão...

Não se esqueçam de dar uma olhada no texto de Ana Antunes, com mais notícias de como ela desenvolveu o trabalho com essa história em sua turma esse ano e a confecção do kit com a participação ativa das crianças! Tem mais fotos do material lá, e ótimas dicas! O link é aqui: clique

Aproveito para agradecer, mais uma vez, a Ana, por essa parceria. Valeu, Aninha!!!

Abraços,
Lica

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Arquivo Alfabético Poético

Oi, minha gente,

Hoje eu vou postar sobre um material muito especial. Especial porque é um material que vem sendo feito há tempos. Porque é cheio de possibilidades.... nada está pronto de antemão..... Especial também porque é um material meio trabalhoso e dispendioso (mas pensaremos em adaptações). Mas, especialmente, porque foi o primeiro material todo pensado a quatro mãos. É o Arquivo Alfabético Poético. Esse é um dos kits de Arquivos Poéticos, junto com outros que venho pensando, como o de Sergio Capparelli, já postado aqui.

Tive essa ideia do Arquivo Alfabético desde que fiz um post sobre os abecedários poéticos, lembram? Está no link Abecedários Poéticos.  A ideia era fazer um arquivo, um fichário mesmo, com fichas separadoras, indicando as letras de A a Z. Só que seria um arquivo a partir de livros que trazem o alfabeto com poemas ou jogos de linguagem. Em cada parte, colocaríamos os poemas, de cada livro, dedicados àquela letra do alfabeto indicada na linguetinha do fichário. 

Veja na figura uma ideia do que é.

O Arquivo Alfabético não apresenta, nesse caso, atividades para esses textos/livros – ao menos não ainda, mas já temos planos de pensar em incluir sugestões – mas sim os próprios textos, com suas ilustrações. Vocês podem se perguntar “sim, mas se temos os livros, para que o arquivo?” – pergunta bem pertinente. Os livros são fundamentais. Mas pensamos que ter esse material em forma de fichas seria bem interessante, pois podemos manipulá-las independentemente, trabalhando com todos os textos de uma determinada letra, por exemplo, ou todos os textos de um mesmo autor/livro.  A ideia do fichário com esse tipo de texto de alfabeto vinha me perseguindo faz tempo...

Pois bem, quando compartilhei essa ideia, ainda um esboço, com Ana Lúcia Antunes, minha amiga de longe e já parceira naquela essa altura, ela logo comprou a ideia e passamos a desenvolver juntas o projeto. Da ideia inicial foram surgindo outras, e também pequenas questões foram aparecendo. Primeiro selecionamos os livros – há muitos! – cada uma de nós conhecia um tanto, cada uma ia descobrindo novos, que cabiam no arquivo. Foi uma pesquisa muito bacana. 


Assim, nessa primeira versão do Arquivo, que pode crescer ainda, entraram 16  livros, de vários autores e editoras (ver lista dos livros abaixo, na nota do post). Temos ainda o ABC Doido, de Ângela Lago, que estamos avaliando se entrará nesse arquivo ou constituirá um kit próprio. No fichário, de cada livro, tem as fichas correspondentes a cada letra e a capa.

Exemplo da parte correspondente à letra A do Arquivo:


Tomamos conhecimento, em nossas pesquisas, de uns livros desse tipo muito legais, de Portugal, mas apenas um deles consta no arquivo, pois Ana conseguiu encontrá-lo. Os outros conseguiremos em outra oportunidade.

O projeto foi todo pensado e elaborado junto com Ana, desde a escolha e a digitalização (escaner) dos livros até a concepção do material – como seriam as fichas, o tamanho delas, como resolveríamos a inclusão das imagens em alguns livros, o jeitão das fichas separadoras, o aumento da fonte dos textos em alguns casos etc. Nos complementamos muito bem em todas essas etapas, Ana sempre experimentava tudo rapidinho e trazia ótimas ideias e soluções. Uma decisão muito importante, que vislumbrei desde o início, foi a de colocar cada livro/autor em fichas de uma mesma cor, assim poderíamos tanto usar o material pela letra que o texto homenageia (tipo todos os textos que falam da letra A), como usar todos os textos de um mesmo autor/livro, indicado pela cor da ficha em que esses textos são colados. Mais tarde veio a ideia do “flex”... Volto a ela, já já.

Com todo o material digitalizado, pronto para imprimir, Ana, no entanto, saiu na frente na produção efetiva do Arquivo – impressão, montagem, plastificação, confecção da caixa. Como estou muito ocupada e com as vistas meio comprometidas, adiei um pouco a confecção do meu. Assim, o que mostro aqui nas fotos para vocês é o Arquivo de Ana, que já está prontinho, pois ela queria começar o ano já usando com sua turma. Nada como uma boa motivação para pormos a mão na massa, né? 

Essa iniciativa de Ana foi muito importante para irmos testando e revendo algumas coisas do Arquivo, pois no fazer mesmo, com a mão na massa, apareceram muitas outras questões a serem resolvidas. Íamos discutindo as saídas, as possibilidades, experimentando e achando as soluções. Assim, Ana tem muitas dicas a dar sobre a confecção, e vai contribuir com isso num próximo post. Esse aqui é só para apresentar o material.

Para fazer a caixa do Arquivo mesmo, foi uma novela. Á medida que as fichas iam ficando prontas, é que íamos tendo a dimensão do tamanho da caixa que precisaríamos para guardá-las. E essa tal caixa ia aumentando, aumentando. Ana ia de lá mandando dizer quantos centímetros já mediam tantas fichas de livros prontas, e eu de cá tomando susto! Não tínhamos essa noção. Mas foi divertido nos surpreender com um tamanho jamais imaginado. Ou seja, íamos descobrindo como fazer o kit, fazendo-o. E descobrimos que era preciso mandar fazer a caixa sob medida, para ser forte e grande o suficiente, sem folgas desnecessárias nem apertos, pois o material era pesado também, quando plastificado na gráfica. Só foi possível descobrir isso com as fichas ficando prontas. Além disso, precisaria ficar esteticamente bem arrumadinho na caixa e com folga para manusear as fichas, procurar fichas pelo meio do arquivo, mexer os separadores para lá e para cá. O jeito que Ana pensou para a caixa é fantástico, bem como um arquivo mesmo, que ao abrir vemos as linguetinhas de fora. Mas demorou um pouco de acertarem fazer isso onde ela encomendou. A primeira caixa que ela mandou fazer ficou apertadinha, embora linda, vejam:



Ela ainda está buscando a caixa perfeita, pesquisando daqui, medindo dali, tomando susto se eu descubro mais um livro que pode virar ficha. A ideia é que fique mais folgadinha, como essa, ao lado, provisória. Ou seja, em breve, Ana nos dará a dica da caixa ideal e a novela terá, enfim, um fim. 

Os vendedores de lojas, bem como nossos maridos, nos acham meio doidinhas... Rsrsrs!!! 

Com o material já sendo confeccionado por Ana, pensamos também em fazer as fichas separadoras “flex”. “Como é isso?” – perguntou Ana, achando que eu estava inventando coisa. Ah, nada mais é do que ter a ficha separadora de um lado com as letras do alfabeto, para separar no fichário o material por letras (todos os textos de cada letra do alfabeto) e, virando a ficha separadora, para separar por autor/livro, ter a linguetinha com a cor correspondente ao livro, a cor das fichas daquele autor. 


Vejam que, assim, podemos arrumar o fichário de dois jeitos diferentes, por letra ou por cor, a depender de como vamos usá-los com as crianças. E Ana deu corpo a essa ideia fazendo com muito esmero suas fichas separadoras. Plastificadas, as linguetinhas com as letras de um lado e a cor do outro ficaram um show!

Como eu disse no início, o Arquivo Alfabético Poético não indica, em si, as possibilidades de uso do material, mas elas são infinitas. Ana pretende postar, em algum momento, algumas sugestões ou atividades que desenvolver em sua turma. Eu também prometo fazê-lo de tempos em tempos. Mas cada um pode – e deve – explorar o Arquivo, bem como os livros a partir do qual é feito, de muitos jeitos. Só ler os textos já é bem bacana. Trabalhar as letras assim, no contexto de textos poéticos, certamente será uma delícia! Por outro lado, cada livro/kit de fichas poderá apresentar possibilidades diversas, por sua própria natureza, assim como cada textinho pode dar atividades interessantes independentemente de seu conjunto, como fiz uma sugestão no post que está no link O que se vê no R, a partir do poeminha de Elias José para a letra R, ou no link  O que se vê no Q, para a letra Q.

Bom, minha gente, por ora é isso, apenas para apresentar o material, o Arquivo... Ele está lindo assim, não acham? Mas é possível fazer adaptações para simplificar e baratear a confecção, para mais pessoas poderem experimentar fazer um Arquivo para o seu grupo, mesmo que não entrem todos os livros. Em breve postaremos mais sobre ele, com essas dicas.

Agradeço a Ana por compartilhar as fotos de seu Arquivo pronto com a gente, além, claro, pela parceria nesse projeto que agora é totalmente nosso, totalmente compartilhado. Vejam mais fotos no post de Ana, no link Álbum Arquivo Alfabético Poético. Não está lindo, colorido,  maravilhoso?!!!! Pois é... A gente chega lá! Eu chego lá!!!

Para ver uma das propostas que Ana fez a partir do Arquivo, veja no blog dela, aqui.

Ah, lembrem que, de qualquer modo, apenas a indicação dos livros usados no arquivo já é também uma boa sugestão para trabalhar com as crianças, heim? E, como sempre digo, ter os livros, manuseá-los, lê-los, é fundamental.

Espero que gostem,
Um abraço,
Lica

Lista dos Livros do Arquivo Alfabético Poético:
  1. Uma letra puxa a outra (José Paulo Paes). Companhia das Letrinhas 
  2. O que se vê no abecê (Elias José). Ed. Paulus
  3. As Letras (Lalau e Laurabeatriz). Ed. Amarilys
  4. Palavras, muitas palavras (Ruth Rocha)
  5. No Balancê do Abecê (Elias José). Ed. Paulus
  6. O Batalhão das Letras (Mario Quintana). Ed. Globo
  7. Bichodário (Telma Guimarães). Ed. Escala
  8. De Letra em Letra (Bartolomeu Campos de Queiroz). Ed. Moderna
  9. Alfabetário (José de Nicola). Ed. Moderna
  10. ABC quer brincar com você (José Santos). Ed. Companhia Editora Nacional
  11. ABC das Rimas (César Obeid). Ed. Salesiana
  12. Bichionário (Nilson José Machado). Ed. Escrituras
  13. Quem lê com pressa tropeça (O ABC do trava-língua). (Elias José). Ed. Lê/Casa de Livros.
  14. ABC e Numerais: pra brincar é bom demais. (Tatiana Belinky). Ed. Cortez
  15. Alfabeto dos bichos (José Jorge Letria). Ed. Oficina do Livro
  16. ABC (Tatiana Belinky). Ed. Elementar

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Faltando Vogais

FALTANDO VOGAIS



O jogo Faltando Vogais é, em sua forma, uma variante do material Faltando Letras, pois se apresenta como fichas com uma figura e quadradinhos para cada letra da palavra que corresponde à figura. Entretanto, na ficha aparecem apenas as consoantes da palavra, os jogadores terão que preencher as vogais de acordo com o lance no dado de vogais. O jogo compõe-se das fichas de palavras, do dado de vogais (contendo as cinco vogais gráficas e uma face neutra, com uma figura ou sem nada) e fichinhas com as letras móveis (vogais) para preencher as lacunas. 



 Esse jogo visa promover a reflexão sobre a escrita de palavras, valendo-se, sobretudo, de uma análise fonológica das vogais que aparecem em suas sílabas. Cada jogador terá que refletir sobre os sons das palavras que ele retirar para si, para poder encaixar as letras nas lacunas das fichas. Para tal, deverá se concentrar nos sons orais, vocálicos, analisar o som das vogais nas sílabas das palavras. O jogo trabalha, assim, a consciência de fonemas vocálicos (pois foca a atenção nas vogais que são o núcleo dessas sílabas), mas não deixa também de chamar a atenção para essas sílabas. 
O jogo, claro, não se destina a quem já sabe escrever alfabeticamente, ou está perto disso, pois para esses não se constituiria em um desafio. O jogo é especialmente produtivo para aquelas que, no intermediário entre o pré-fonético (pré-silábico) e o silábico, estão começando a considerar a escrita como notação da pauta sonora da língua, ou seja, para o iniciozinho da fonetização da escrita - o jogo ajuda nisso. Mas é muito interessante também para crianças que estão pensando a escrita a partir de uma hipótese silábica quantitativa, para que avancem e considerem as vogais pertinentes às sílabas das palavras, ou seja, o valor sonoro das vogais em cada sílaba. Mas pode ainda ajudar crianças com hipótese silábica qualitativa, seja grafando prioritariamente as vogais ou também as consoantes de uma sílaba, pois tem lá as letras todas das palavras, desafiando-as a considerar que essas palavras têm mais de duas letras. Ao fazerem o esforço para pensar os sons orais que compõem a palavra, as crianças vão observando ali na ficha as outras letras que compõem a palavra, o que os provoca a todo o momento a refletirem sobre os outras unidades (os fonemas consonantais) presentes naquela pronúncia, sendo desafiados em suas hipóteses.
A finalidade do jogo é completar um número dado de cartelas de palavras; quem o fizer primeiro, ganha o jogo. Para jogar, é preciso combinar de antemão o que a face em branco do dado (ou com algum desenho ou símbolo) vai valer. Quando essa face cai para um jogador, ou ele perde a vez de jogar ou pode escolher a fichinha de letra que precisa na mesa. É só definir de antemão a regra e essa passa a valer naquela partida.  


 REGRAS DO JOGO: 

Estipular a quantidade de fichas a serem preenchidas para ganhar o jogo (ex. 5 fichas), bem como o valor da face vazia do dado (perder a vez, repetir ou pegar a letra que precisa).
Viram-se as fichas de palavras de cabeça para baixo e as fichinhas de letras devem ser espalhadas na mesa, viradas para cima.
Os jogadores pegam aleatoriamente uma ficha, sem ver, sem escolher. Escolhe-se, então, por qualquer método, o jogador que iniciará e o sentido do jogo. O jogador da vez joga o dado e pega na mesa uma das fichas de letras com a vogal que foi indicada na face do dado. O jogador deverá confirmar se a letra preenche a lacuna vazia ou não. Os outros jogadores podem ajudar a avaliar se está correto ou a encontrar a correta, numa variante colaborativa do jogo.
O objetivo de cada rodada é completar uma das lacunas da palavra com a letra que for indicada no lance do dado. O dado deve ser lançado apenas uma vez por cada jogador, em cada rodada. Se a letra indicada no dado aparece mais de uma vez na palavra de sua ficha, ainda assim o jogador só poderá pegar uma ficha de vogal naquela rodada.
Se a vogal indicada no dado não servir para a palavra de sua ficha, o jogador deve pegá-la, mesmo assim, na mesa. Não a utilizando, o jogador a retém, podendo utilizá-la em outras rodadas, para preencher outras cartelas de palavras. Se a vogal retida serve para a palavra de sua próxima cartela, ele a preenche tão logo retirar a nova cartela, começando, assim, já em vantagem.
O jogador só poderá pegar outra ficha de palavras quando completar a que está em suas mãos. Quando completar uma, pega outra, até preencher corretamente (segundo o julgamento da mesa) o número de fichas estipulado de antemão (ex. 6 cartelas), ganhando o jogo aquele que completar essa meto primeiro. O jogo pode continuar e constituir o segundo, terceiro lugares...
Os jogadores podem ajudar uns aos outros na reflexão sobre as vogais que compõem a palavra da ficha de cada um. 

O número de fichas a preencher para ganhar o jogo pode ser adaptado à quantidade de fichas do kit e a quantidade de jogadores. O Faltando Vogais mostrado aqui é o de 4 letras, mas é bacana também o de 6 letras (com palavras com três sílabas canônicas: CV, consoante + vogal). Para o jogo de 4 letras, cinco ou seis fichas é um bom número, para o de 6 letras, deve ser estipuladas menos fichas como limite, mas isso é muito relativo. Cada professor pode avaliar e experimentar o número de fichas que é bom para sua proposta, pois depende do nível das crianças, do ritmo do jogo, do número de jogadores. O número ideal de jogadores é de quatro, mas, pode ser menos ou mais, dependendo do número de cartelas disponíveis e do dinamismo do jogo.

Errar ou acertar as vogais pode ser uma variável importante no resultado: cada um tem que preencher sua cartela e o professor tem que estar atento, por perto, para legitimar as discussões dos jogadores sobre estarem ou não corretas as palavras. Mas, por outro lado, o erro ou acerto pode não ser uma variável importante no resultado, mas sim a sorte do dado, os jogadores podendo então ajudar uns aos outros na reflexão sobre as vogais que compõem a palavra da cartela de cada um. Essa variante colaborativa pode ser interessante e produtiva, a outra versão implica em competição em relação ao saber de cada um.
Durante o jogo, os jogadores podem tirar dúvidas com a professora - que é diferente de ela dar as respostas. O professor não precisa corrigir casos de escrita de I e U no lugar de E e O quando essas as letras têm o som /i/ e /u/, a não ser que as crianças levantem essa questão ou que seja natural explicar, sem que se perca a dinâmica do jogo. O uso das letras I e U no lugar de E e O átonas no final de palavras (Ex.: RATU para RATO ou BULI para BULE) não deve, de início, ser considerado erro e, caso o grupo não questione, pode ser aceito, já que, nesse momento inicial o importante é garantir a observação e consideração do som, e de fato, o O e o E podem fazer som de U e I. A questão da ortografia virá num momento posterior. Como no momento o que importa é considerarem os sons que aparecem nas palavras, não é ainda um problema se usam a letra que representa foneticamente aquele som e não a letra que ortograficamente corresponde àquela grafia. É importante observar que o jogo é para trabalhar a relação entre sons e letras, ainda não sendo o foco, no nível de reflexão das crianças nesse momento, pensar sobre as dificuldades ortográficas de modo mais sistemático. Mas não é impeditivo que se explique que o E e O podem ter som de I e U, desde que a situação seja propícia.

Entretanto, como existem algumas palavras de uso frequente no jogo, pode ocorrer de questionarem a escrita de RATU, por exemplo, e aí sim, o som de /u/ da letra O (ou de /i/ da letra E) pode ser problematizado, explicado e considerado no jogo. Nesse momento, os jogadores podem ser informados que apesar do som de /u/ (ou/i/), essa palavra se escreve com O (ou E). O que, de início, de todo modo, não assegura que generalizem esse uso para outras palavras terminadas em O átono (ou E). Aos poucos a professor pode ir ajudando-os a generalizar e a corrigir eventuais situações de hipercorreção (Ex.: achar que caju se escreve com O), trazendo, aos poucos, informações relativas à tonicidade das palavras.
O mesmo ocorre para o uso dessas letras, I e U, em outras posições nas palavras, como CO de coruja, por exemplo, ou ME de menino. Não se deve enfatizar o som /co/ da sílaba (ou /me/) ao pronunciar a palavra, para explicar sua grafia, ou informar erroneamente que o certo é falar /koruja/ em vez de /kuruja/ (ou /menino/ em vez de /mininu/, pois essa pronúncia depende da variedade linguística, todas legítimas. Não devemos confundir escrita correta com a fala, que pode ser expressa de modo diverso. A escrita não é espelho da fala. Se não, pronunciaríamos /Rato/ e não /Ratu/, como é o caso. Essa é uma questão muito importante de se considerar, quando trabalhamos com a reflexão fonológica em presença da escrita.
                                                                    
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FALTANDO CONSOANTES: variante do jogo
Como o seu grupo estava mais adiantando na reflexão sobre os sons presentes nas palavras, a professora Lilian Evaristo, de São Paulo – que sempre está por aqui no blog e confeccionando e usando muitos materiais – adaptou o jogo Faltando Vogais e propôs a seu grupo o Faltando Consoantes. Usando as mesmas fichas de palavras e a mesma lógica, colocou as vogais nas fichas, em vez das consoantes, aumentando bastante o desafio. 

O desafio aí é tentar perceber os sons consonantais presentes nas palavras para preencher as lacunas. Muito interessante como proposta para desafiar mais aqueles que já operam bem com sons vocálicos das palavras, os relacionando às vogais-letras. Os fonemas consonantais são mais difíceis de serem delimitados e isolados na fala, especialmente alguns (como os oclusivos), e é na presença das palavras - em suas junções com as vogais, nas palavras diferentes que as trocas entre eles produzem - que se tornam mais observáveis. Assim, é uma variante muito interessante de reflexão fonológica sobre sílabas e fonemas, em presença da escrita. 
Para jogar o Faltando Consoantes, o dado não seria possível, então, Lilian teve uma ideia muito bacana e fez uma roleta com as consoantes.
O jogo funciona do mesmo jeito, só que cada jogador roda a roleta e vê se a letra lhe serve. Lógico que aí há uma demora maior para preencher a ficha, pois em vez de 6 possibilidades, ele terá 18 (não considerando o K, W e o Y). Nesse caso, eu sugiro que cada um pegue, por vez, mais de uma ficha de palavras: duas, de início, ou até três.
          

Obrigada a Lilian pela sugestão muito interessante. Sendo assim, temos duas possibilidades de jogo (jogo mesmo), com a estrutura do material Faltando Letras, que, como vocês já viram nos posts e fotos, está presente em várias situações, apenas para serem preenchidos, não necessariamente como jogo.
É isso, gente. Esse é um jogo aparentemente bem simples, capaz até de passar meio despercebido por alguns, mas que todas as professoras que o utilizam em suas salas relatam que é muito bom para a reflexão das crianças sobre a escrita e seus avanços. Experimentem!
Lica